Estudo sugere avaliar risco de AVC com exame da retina por meio de IA
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Um novo estudo investiga a associação entre a quantidade e as características dos vasos sanguíneos na retina e o risco de desenvolver um AVC (acidente vascular cerebral). A proposta é que o exame da retina com inteligência artificial ofereça um complemento a exames tradicionais como os de colesterol e glicemia.
Marcelo Franken, diretor da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo) e gerente médico do Hospital Israelita Albert Einstein, explica que "a retina é um dos lugares mais acessíveis para observar vasos sanguíneos com exames clínicos, ainda que seja necessário o uso de equipamentos específicos, como lentes e fontes de luz".
O estudo foi publicado em novembro na revista científica Heart. Com o auxílio de inteligência artificial, os pesquisadores analisaram imagens da retina e identificaram parâmetros que podem indicar maior risco de AVC. Vasos sanguíneos de estrutura mais simples, com menos ramificações, por exemplo, podem indicar problemas na circulação e maior chance de hipóxia (falta de oxigênio), condições ligadas ao AVC.
Durante um acompanhamento médio de 12,5 anos, foram registrados 749 casos de AVC entre 45.161 participantes.
O estudo identifica 29 parâmetros significativamente associados ao risco de acidente vascular cerebral, como a quantidade de vasos (densidade), o calibre (se são mais largos ou estreitos), a tortuosidade (se são mais retos ou sinuosos) e a distribuição (como estão espalhados pela retina).
A análise da retina é uma técnica não invasiva, rápida e acessível, podendo ser integrada aos check-ups oftalmológicos de rotina.
Já o uso de inteligência artificial aumenta a precisão na avaliação do risco de AVC, tornando o exame mais eficiente, diz o estudo. A combinação dessas informações com as de idade e sexo apresentou resultados tão bons quanto os métodos tradicionais que analisam colesterol e pressão arterial, afirmam os pesquisadores.
O neurocirurgião Hugo Sterman, especialista em AVC da Rede D'Or, diz que os vasos da retina têm características semelhantes aos vasos do cérebro, especialmente em relação a mudanças provocadas por fatores de risco clássicos para derrames, como pressão alta, diabetes, colesterol elevado e tabagismo. Por isso, observar alterações nesses vasos pode ajudar a avaliar o estado de saúde dos vasos cerebrais.
"É possível que, no futuro, com auxílio de inteligência artificial, esse método possa ter um custo vantajoso e de baixo risco", afirma Sterman.
O cardiologista Marcelo Franken afirma que a retina já é analisada rotineiramente em pacientes com hipertensão e diabetes, pois mudanças visíveis nos vasos indicam problemas de saúde mal controlados. A novidade do estudo, ele avalia, está no uso da inteligência artificial para identificar alterações que não são perceptíveis ao olho humano.
Ele ressalta que exames como o de colesterol e a avaliação de calcificação coronária também são utilizados desde a juventude, embora exijam recursos laboratoriais e procedimentos mais invasivos. "Não é uma descoberta revolucionária, mas é uma ferramenta adicional interessante para avaliar o risco de doenças vasculares", afirma.
A análise dos vasos da retina tem potencial para ser incorporada futuramente na avaliação de rotina, permitindo um melhor controle de fatores de risco e ajustes mais precisos nas medicações, aprimorando o acompanhamento dos pacientes, citam os especialistas.
Embora promissor, o estudo precisa ser validado em populações mais diversas. A pesquisa utilizou dados do UK Biobank, com predominância de participantes brancos.
De acordo com Marcelo Franken, diferenças genéticas e biológicas podem influenciar tanto o risco de doenças quanto a resposta a tratamentos. "Algumas etnias têm mais propensão a desenvolver doenças como diabetes ou hipertensão, enquanto outras podem responder de forma distinta a medicamentos."
O médico acrescenta que a diversidade étnica do Brasil torna pesquisas realizadas no país mais representativas para diferentes populações. "O estudo traz novas possibilidades, mas ainda não podemos generalizar os achados sem mais evidências."
O levantamento foi conduzido por pesquisadores do Centre for Eye Research Australia, Universidade de Melbourne, Harvard Medical School, Beijing Tongren Hospital e Hong Kong Polytechnic University.